PRF arquiva denúncias de assédio, e mulheres dizem que testemunhas não foram ouvidas
Servidor denunciado nega todas as acusações, afirma que caso foi investigado e ele, inocentado
Brasília|Natália Martins, da RECORD

Seis servidoras da Polícia Rodoviária Federal denunciaram o ex-chefe de gabinete da superintendência de Minas Gerais Marcos Roberto da Silva como responsável por diversos casos de assédio sexual e moral. O processo istrativo aberto para investigar o caso foi arquivado depois de cinco anos. De acordo com as mulheres que relatam o suposto assédio, testemunhas das vítimas não foram ouvidas.
Silva afirma que todas as acusações foram apuradas e ele, inocentado. “Ocorreram todas as apurações, mediante investigação inclusive com perícias, e fui inocentado. Questão já transitada em julgado, além de já prescrita há mais de um ano”, disse à reportagem. A defesa dele diz que a inocência dele foi inquestionavelmente comprovada (leia íntegra da nota ao fim da reportagem).
Policiais, servidoras istrativas, terceirizadas e uma estagiária afirmam que ele era atencioso no começo, se aproximava e depois tentava forçar intimidade. Ao ser recusado, segundo os relatos, começava a difamá-las, tratá-las mal e tentava intimidá-las.
Depois da primeira denúncia, uma comissão foi formada pela corregedoria, em 2018, para a investigação preliminar na corporação. Outras vítimas denunciaram, mas foram ouvidas como testemunhas do primeiro caso. Nessa comissão, o resultado foi pela abertura de um Procedimento istrativo Disciplinar (PAD), justificado pelos depoimentos dessas mulheres que denunciavam um padrão de comportamento na abordagem do ex-chefe de gabinete.
As mulheres ouvidas no PAD apontaram testemunhas que teriam presenciado assédios. Depois de cinco anos, o ex-chefe de gabinete entrou com um processo cível de danos morais, baseado no arquivamento do PAD.
As mulheres alegam que apenas com essa ação tiveram o aos resultados do processo investigativo que a corregedoria fez. Elas dizem que o órgão interno não ouviu testemunhas indicadas por elas, mas escutou aquelas que foram apresentadas pelo ex-chefe.
Relatos
Nos depoimentos, mulheres narram situações que teriam acontecido durante o período em que trabalharam com o ex-chefe de gabinete — para preservar as identidades, os nomes foram trocados.
A policial rodoviária federal Manuela trabalhava na sede, em Brasília, quando recebeu a proposta para ir para Minas Gerais depois de participar de uma operação no estado.
Ela afirma que o ex-chefe de gabinete se aproximou dela e teria começado a enviar mensagens intimidadoras. Manuela diz que fugia nos corredores e se escondia entre armários. Em uma situação, Silva teria tocado na cintura dela e forçado um beijo na sala do gabinete da superintendência de Minas Gerais.
Juliana, uma segunda policial rodoviária, afirma que Silva a convidava para reuniões a sós no gabinete. Segundo o relato dela, inicialmente ele se aproximava devagar, depois tentava alguma intimidade até ser mais agressivo nas investidas pessoais. Juliana diz que ele começou a perguntar sobre seus seios e se ela tinha prótese de silicone.
Soraya era servidora terceirizada no gabinete da PRF em Minas e afirma que Silva a tocou por trás, colocou o rosto no ombro dela e disse que sentiu que ela se “arrepiou” com o toque dele.
Marina é servidora istrativa e diz que o chefe de gabinete tratava a todos muito mal e que bateu com a arma na mesa em um dia e ameaçou atrapalhar o estágio probatório da servidora. Ela também relata que Silva teria a tocado sem consentimento.
Outros casos
A direção-geral da PRF recebeu, nesta semana, um ofício de servidores que se solidarizaram aos relatos das mulheres. O caso de Minas Gerais não é único relatado à reportagem. Segundo outras funcionárias ouvidas, as denúncias seriam em geral arquivadas.
Procurada pela reportagem, a Polícia Rodoviária Federal afirmou que em 29 de maio, a Corregedoria-Geral instaurou procedimento interno para apurar novas denúncias repercutidas por veículos de comunicação e redes sociais. “O procedimento instaurado irá investigar a eventual existência de irregularidades e novas informações”. A Controladoria-Geral da União, responsável por fiscalizar as corregedorias, não se posicionou.
Ao fim do mandato de ministro da Justiça e Segurança Pública, o agora ministro do STF Flávio Dino levantou uma questão sobre problemas nas corregedorias e uma possível solução: um projeto de corregedoria única nacional que fique subordinada à pasta. Perguntado se o projeto estava em andamento ou se havia alguma maneira de controlar casos do tipo, o ministério não respondeu.
A defesa do ex-chefe de gabinete da superintendência de Minas Gerais Marcos Roberto da Silva afirmou que a investigação seguiu o devido processo legal e comprovou a inocência dele. Leia a nota na íntegra:
“O processo deflagrado em relação ao ex-chefe de gabinete da PRF regional MG foi completamente pautado no devido processo legal e na legalidade, sendo acatadas todas e quaisquer sugestões da comissão de investigação preliminar. O PRF não acompanhou o testemunho das supostas vítimas que manifestaram interesse em sua ausência, a investigação preliminar e a maior parte do processo istrativo foram conduzidas com a presença de um membro feminino na comissão processante e as vítimas foram ouvidas em ambos os procedimentos, lhes sendo dadas a palavra, livremente, para expressar e relatar tudo que achassem adequado, podendo, inclusive, serem acompanhadas de advogado, caso assim desejassem. O PRF não recorreu ao sindicato, contratando advogada particular para acompanhar o caso. Os autos foram arduamente instruídos com a realização de perícia no local do suposto fato e oitiva de todos aqueles que poderiam trazer informações pertinentes ao caso. Foi um processo longo e complexo, onde houve, inclusive, a ocorrência de falso testemunho, tendo a comissão autorizado prontamente que a suposta vítima se retratasse e não incorresse na prática de crime. O feito transitou em julgado com seu devido arquivamento, tudo com o pleno respeito ao devido processo legal e a lei. A inocência do PRF foi inquestionavelmente comprovada, e, finalmente, este pode tentar seguir sua vida, com sua esposa e filhos.”