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R7 Entrevista

‘Hoje é fruto de uma luta que não foi em vão’, diz Karen Jonz, 1ª campeã mundial de skate do país

Atleta, que abriu caminho para Rayssa Leal e Letícia Bufoni, concilia os treinos nas pistas com a rotina de musicista, influenciadora e mãe

Entrevista|Laura Margutti*, do R7

Karen Jonz chegou a treinar com infecção urinária e se cobrava para ter melhor desempenho possível Reprodução/Instagram @karenjonz

Karen Jonz é referência no skate brasileiro e internacional. Pioneira no esporte, foi a primeira brasileira a conquistar o ouro feminino no X Games, uma espécie de Jogos Olímpicos dos esportes radicais, e é tetracampeã mundial de skate vertical.

Aos 17 anos, ela resolveu vender bolos na escola onde estudava para comprar um shape, aquela pranchinha do skate, e assim começava a trajetória de Karen.

No início, competiu entre os homens e teve de lutar contra o machismo. “Eu me sentia muito pressionada pela invisibilidade no skate feminino. Treinei com infecção urinária, fazendo xixi com sangue”, conta Karen em entrevista ao R7.

Ela conquistou títulos e abriu portas para que surgissem estrelas como Rayssa Leal, a Fadinha, dona de duas medalhas olímpicas de skate, Letícia Bufoni, campeã mundial e medalhista de X Games, e Pâmela Rosa, bicampeã mundial e medalhista em X Games.


“Vemos um acolhimento muito maior, as meninas se sentem mais à vontade para andar de skate e serem quem são. Isso é só o começo. O que estamos vivendo hoje é fruto de uma luta, que não foi em vão”, comemora.

Fora das pistas, Karen é musicista, youtuber e mãe. Após o nascimento da filha Sky Jonz, ela enfrentou desafios para voltar a competir, mas retornou em 2017 e venceu a 1ª etapa do “Vert Battle”.


Em novo álbum, a artista fala sobre a desigualdade de gênero na modalidade e trata de dilemas como amadurecimento e luto Reprodução/ Instagram

Confira a íntegra da entrevista:

Karen Jonz - No início, eu me via muito pressionada pela invisibilidade no skate feminino. Treinei com infecção urinária, fazendo xixi com sangue. Eu só parei quando acertei a manobra e treinei o que eu precisava. Isso foi um reflexo de como eu me sentia, invisível no skate feminino, e da pressão que eu colocava em mim mesma para alcançar o reconhecimento. Não tinha ninguém me obrigando a isso, mas eu sentia que precisava provar que podia estar ali, que tinha capacidade para competir em alto nível. Olhando para trás, percebo que foi um esforço extremo, mas, ao mesmo tempo, isso me motivava a seguir em frente.

A skatista tem carreira fora do tradicional, e fala sobre ser mãe, musicista e atleta em suas redes sociais Reprodução/ Instagram



R7 - Você mencionou em sua música “Se Eu Fosse o Inverso” a questão do machismo no skate. Como você lidou com essa desigualdade de gênero ao longo da sua carreira?

Karen Jonz - Quando comecei, a visibilidade para as mulheres no skate era praticamente inexistente. Até mesmo quando conquistei meu primeiro título mundial, em 2006, a mídia noticiou a vitória masculina e ignorou a minha. Isso me fez perceber que precisávamos lutar ainda mais por reconhecimento. O machismo estava presente de forma velada e eu sentia a necessidade de provar constantemente que meu lugar ali era merecido.

R7 - Como foi a experiência de ver o skate feminino se tornar respeitado e reconhecido hoje, com jovens como a Rayssa Leal com espaço, e visibilidade no esporte?

Karen Jonz - Eu fico extremamente feliz de ver as meninas, como a Fadinha, dominando as pistas. Hoje a mentalidade está mudando. Vemos um acolhimento muito maior, as meninas se sentem mais à vontade para andar de skate e serem quem são. Para mim, ver essa evolução é o maior reconhecimento do meu trabalho. Sei que abri caminhos para elas. O futuro é promissor. As meninas de hoje têm uma visão mais ampla do que a minha geração tinha, e elas estão muito mais confiantes. O skate feminino está crescendo de forma exponencial, e eu vejo um futuro em que mais meninas estarão competindo, mais visibilidade será dada e mais respeito será conquistado. Isso é só o começo. O que estamos vivendo hoje é fruto de uma luta, que não foi em vão.

R7 - Como você se sente ao olhar para o impacto que seu trabalho teve no skate feminino e na música?

Karen Jonz - É uma sensação de realização, mas também de responsabilidade. Ver as novas gerações de meninas se inspirando no meu trabalho é algo que me enche de orgulho. Eu sabia que o caminho seria difícil, mas acho que, de alguma forma, estou ajudando a criar um espaço mais justo para as mulheres no skate e na música. Agora, o mais importante é que as futuras gerações não enfrentem as mesmas barreiras que nós enfrentamos.

R7 - Você também está investindo na carreira musical. Como a sua trajetória no skate influenciou a sua música e vice-versa?

Karen Jonz - O skate e a música sempre andaram de mãos dadas na minha vida, me ajudaram a superar dificuldades e expressar minhas emoções. No skate, eu usava a raiva para seguir em frente, e na música foi um processo de transformar essa raiva em algo mais profundo, mais reflexivo. O álbum que lancei é uma forma de refletir sobre minha vida, o que ei no skate e como isso me moldou. A música e o skate são formas de resistência e de expressão para mim.


Karen afirma que a música foi uma maneira de transformar a sua raiva em algo profundo e sensível Reprodução/ Instagram

R7 - Não é muito comum associar skate com música, muito menos com uma mulher skatista que também é musicista. Como foi para você lidar com esses estereótipos e o processo de se descobrir nesses dois universos?

Karen Jonz - Eu sempre me senti limitada por esses estereótipos, como se eu tivesse que cumprir o que era esperado de mim. No skate, por exemplo, era esperado que eu usasse calças largas e gostasse de rock e rap. Mas com o tempo, eu fui entendendo que não precisava me encaixar nesse molde. Eu posso ser quem eu sou, com as minhas preferências e gostos. O skate, que por muito tempo foi dominado pelos homens, também sofreu influências deles. Mas eu trouxe para o skate coisas que não eram tão comuns, como a música, e acho que isso também foi uma contribuição para a cultura do esporte no Brasil. As meninas de hoje, por exemplo, quando começam a andar, se veem representadas, sabem que podem ser quem elas são. Não precisam seguir esses padrões.

R7 - Durante a sua trajetória, você enfrentou momentos de grande dor, como a perda do seu avô e primo. Como o luto influenciou sua carreira e o seu modo de ver o skate e a vida?

Karen Jonz - A perda do meu avô e primo foi um momento muito difícil para mim. Eu estava no auge da minha carreira, começando a conquistar títulos e viajando para competições e o luto me pegou de surpresa. Eu não consegui ir aos velórios, não pude me despedir, e isso me marcou muito. Nesse período, percebi que a dor e a perda eram tão grandes que, de certa forma, me obrigaram a encontrar forças dentro de mim para continuar. O skate se tornou uma forma de canalizar toda essa dor. Eu competi com o coração partido, mas ao mesmo tempo, o esporte me deu uma razão para seguir em frente, me ajudou a processar tudo aquilo. De algum modo, foi uma maneira de superar. O luto me ensinou que, mesmo em momentos de imensa tristeza, é possível seguir em frente, encontrar propósito e até crescer."

*Sob supervisão de Carla Canteras

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